Isolamento

Maria Clara Dantas
2 min readJul 1, 2020

Eu tenho tanta coisa que podia fazer, mas não faço nada. Os dias todos parecem o mesmo. Não sinto o tempo passar. Estou emperrada entre a música que acabou, e a que ainda não começou. Essa pausa silenciosa, como o papel branco que ainda não foi riscado. Agonizante como um monstro à espreita. Que silêncio.

Nem as folhas se mexem lá fora. Tudo parou. O mundo todo parou. As pessoas se envolveram em bolhas de sabão. A gente consegue se ver mas não consegue se sentir. Não te escuto. Não sinto teu cheiro. Não sinto teu gosto. Não sinto tua pele. Que saudade de te sentir.

Nos isolamos no mato, no fim de 40 minutos de uma estrada de terra. Cercados de mato. Uma terra calma, gostosa. Cheiro de selvagem, fruta tirada do pé e suco que escorre no canto da boca. Pés sujos de terra, e sol brilhando linhas por entre os galhos de uma árvore grossa.

Me deitei num galho grosso e fechei os olhos. Esse silencio todo me fez escutar a solidão lá no fundo da raiz. O distanciamento meu comigo, que se escondia a mais tempo do que eu entendo.

Tão difícil olhar pra nossas sombras, é uma terra tão assustadora, incerta, confusa. E eu precisei me permitir ficar lá sozinha, com medo da iminência de um barulho, até meus olhos acostumarem com a escuridão.

Foi aí que todos os vagalumes saíram dos seus esconderijos. A floresta escura brilha como uma galáxia na terra. A pele arrepia e os olhos marejam. Como é linda minha escuridão. Que saudade desse lugar que eu me esqueci que era eu. Meus olhos só precisavam de silêncio pra entender. A angustia era só medo. E quando eu vi, encontrei minha voz brilhando meio aos vagalumes.

Me desgrudei desse pântano sem tempo. Não precisei esperar a música começar.

Eu reaprendi a cantar.

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Maria Clara Dantas

I’m MC, also known as Maria Clara Dantas. I’m a filmmaker, photographer and teacher who loves writing on her free time.